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Professor vítima de racismo em escola particular faz desabafo na internet
Professor vítima de racismo em escola particular faz desabafo na internet
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Por: A Tribuna Data da Publicação: 03 de julho de 2020FacebookTwitterInstagram

“Numa sociedade racista, não basta não ser racista é preciso ser antirracista”. A frase emblemática da filósofa Angela Davis foi citada em um depoimento emocionante do professor do Colégio La Salle Abel, em Icaraí, na Zona Sul de Niterói, que foi vítima de racismo em uma aula online de história que ministrava no dia 18 de junho. A vítima tem nome e sobrenome: José Nilton Júnior, que além de qualificações e especializações na temática racial, nunca tinha passado por preconceito no ambiente escolar. Invés de ir à delegacia registrar uma ocorrência, ele preferiu um encontro online com a direção da escola, os pais do aluno e o próprio aluno que fez comentários xingando o professor de “gorila” e “macaco” durante a aula.

O caso ganhou repercussão após divulgação nas redes sociais, mas a ideia não partiu do professor, que é mestre em História da África pela Universidade Federal Do Rio De Janeiro (UFRJ). Ele contou que no dia da aula cerca de 100 alunos estavam online e o comentário foi feito durante a aula do 7º ano.

“Eu não vi o que aconteceu e encerrei a aula normalmente. Depois de uns dias recebi um comunicado da escola me ajudando a enfrentar a situação. Aí que fui entender o que tinha acontecido. Eu fiquei triste mas o preconceito sempre fez parte da minha vida. Já aprendi a conviver com isso, mas dentro da escola eu nunca pensei em passar por isso. O racismo não é uma patologia e está em uma estrutura. Ele está naturalizado mas não é natural”, desabafou o também coordenador da área de Ciências Humanas do Abel.

E no lugar do ódio e da raiva o professor conseguiu usar toda a força, que foi obrigado a construir durante toda vida, e ressaltar os pontos positivos desse momento constrangedor. A unidade escolar de classe alta de Niterói criou, após o caso, um Comitê das Relações Étnicas-Raciais com a função de implementar uma política de combate e conscientização contra o racismo dentro da unidade escolar.

“Recebi muito apoio dos alunos da escola e de muitas pessoas nas redes sociais. Os alunos que fizeram a queixa na direção da escola e isso me deixou muito emocionado. Temos que ter noção que estamos falando de uma criança de 12 anos e eu não tenho outra opção a não ser desculpar, e como professor, ensinar que o racismo é errado. Só de estarmos refletindo sobre isso é outro avanço e até mesmo a visibilidade que o caso ganhou serve para mais reflexão”, relatou.

O Colégio La Salle Abel informou que os responsáveis pelo aluno envolvido no ato estão cientes, respondendo pela ação do estudante e em diálogo com a equipe diretiva e pedagógica, tendo sido informados sobre as penalidades envolvidas no processo.

“Vale salientar que estamos seguindo as orientações do regimento interno da Instituição e foram atribuídas punições de acordo com a gravidade do fato, algumas já cumpridas e outras em andamento, pois avançam do Regimento Interno para as medidas judiciais, que possuem etapas a serem seguidas. Ainda segundo a nota o colégio repudia atos de discriminação de qualquer natureza em nosso Colégio e na Sociedade e que vamos seguir lutando para que direitos sejam mantidos e que deveres sejam cumpridos”, diz outro trecho da nota.

“Não vou registrar o caso e a escola cumpriu os trâmites legais dentro desse contexto. A comunicação interna e até mesmo procedimentos internos para encerrar o caso. O aluno me pediu desculpas e os pais dele também e eu desculpei. Todo mundo aprende com os erros e eu acredito que essa foi a maior lição”, finalizou o professor José.

RACISMO É CRIME

O advogado criminalista Hebert Borges explicou que é dever do Estado criar e manter ativas politicas sociais de enfrentamento ao racismo e qualquer outro tipo de preconceito. Ele ainda explicou que no Brasil existe hoje na esfera penal a incidência de dois tipos de responsabilidade penal para o assunto abordado, com conceitos jurídicos diferentes, no qual consistem no crime de injúria racial previsto no artigo 140, paragrafo 3° do Código Penal e o segundo previsto na Lei 7.716/1989 – Lei de Racismo.

“Além das politicas públicas, a criação de leis e fortalecimento da sua aplicação, são essenciais para o combate ao racismo. A injuria racial, consiste atingir a honra de uma pessoa diretamente valendo-se de elementos referentes a sua cor, etnia, religião ou origem, no qual inclusive idosos ou deficientes físicos podem ser abrangidos por tal crime. Se trata de um crime com pena de reclusão de um a três anos e multa, além da pena correspondente à violência, para quem cometê-la, podendo ocorrer os efeitos da prescrição. No que se refere ao crime de racismo previsto na Lei 7.716/1989, este atinge um campo mais amplo, caracterizado quando realizado com o objetivo de atingir a integralidade de um grupo em razão da sua raça. É um crime inafiançável e imprescritível, conforme previsão constitucional, cabendo ao Ministério Público a titularidade da ação”, finalizou.

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