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Para além de suas convicções ideológicas para a direita, Silvio Santos, está sendo homenageado como o maior comunicador de TV neste século, após sua morte aos 93 anos. Foi, sem dúvida, o maior comunicador popular deste país e, com vocação também para o empreendedorismo, construiu um império nas áreas de Comunicação e Entretenimento.
Sua trajetória e sucesso passam pelo destino das oportunidades, pelo talento, obstinação em crescer e, principalmente, por muita ralação, sola no pé, como camelô no Rio e na Praça Araribóia, em Niterói e, no dia a dia na travessia das barcas, antes da ponte Rio Niterói.
O Brasil começava a fase de redemocratização, após a ditadura do Estado Novo (1945), e o jovem Silvio Santos, nascido na Lapa, vendia capa para título de eleitor como forma de sobrevivência. Já naquela época sua voz chamava atenção, e um dia foi aconselhado e convidado a fazer um teste na Rádio Guanabara. Passou em primeiro lugar, mas em pouco tempo depois, preferiu ser camelô porque ganhava melhor.
Porém, seu talento como radialista já era conhecido, e foi convidado novamente para trabalhar em outra rádio, a Rádio Continental, com sede em Niterói, capital do Estado do Rio de Janeiro.
De radialista, a camelô de vendas de canetas na Praça Araribóia, Silvio inicia sua trajetória de animador e empreendedor ao analisar que, durante o trajeto das Barcas Niterói, as pessoas pareciam tristes , e, então, percebeu que poderia animá-las com pequenos shows, mágicas, brincadeiras e premiações.
Conseguiu um aparelho de som e transformou a barca num auditório. Assim começa o futuro projeto do programa de auditório “Silvio Santos vem aí”.
Deu certo. O próprio dono das barcas o aconselhou a ir para São Paulo. Silvio pediu demissão da rádio Continental e foi tentar a vida na nova cidade. Sem dúvida, simbolicamente, o maior animador de plateia na TV começa nas barcas de Niterói. Seu sucesso cada vez cresce até ser consagrado como o encantador de pessoas, referência para muitos animadores famosos que saíram de sua escola única de interagir com o público.
Já na TV em São Paulo, sempre se permitiu tudo, mesmo sendo visto como preconceituoso. Diante da diversidade de pessoas na plateia (pretas, gordas, com deficiências, jovens e idosos, ele quebrava todo paradigmas fazendo piadas com o grotesco, no estilo comédia pastelão e, aop ao mesmo tempo dando aparente voz a estas pessoas.
Há quem discorde de tantas homenagens ao Senhor da Televisão, que deixa um legado único como animador que sabia falar e chegar a linguagem do povo.
Quanto a questão ideológica de Silvio Santos apoiou a Ditadura Militar de 1964 e, foi grande beneficiado do governo Bolsonaro com suas práticas contra a Democracia. Outra questão que mancha a biografia de Silvio Santos foi sua batalha contra o dramaturgo José Celso Correa por causa de um terreno em São Paulo.
Neste sentido, vale lembrar o dramaturgo Nelson Rodrigues, considerado o mais influente dramaturgo do Brasil, que apoio apoiou o Golpe Militar de 64 depois teve suas obras censuradas pelo mesmo governo. Contradições misturam-se a talentos, revelando as diferentes facetas neste caminhar da vida, e tudo isto ficará para avaliação histórica e na memória brasileira.
Silvio Santos entra para o celeiro dos inúmeros e grandiosos artistas e comunicadores que nasceram, outros que apenas moraram e trabalharam em Niterói. Aliás, Carlos Manoel da Nóbrega, diretor do SBT, que deu acolhida a Silvio Santos, nasceu em Niterói.
Nesta cidade, para alguns pesquisadores, é onde começou o teatro brasileiro com a encenação do Auto de São Lourenço de autoria José de Anchieta; o compositor Milton Nascimento criou o Clube da Esquina, em Niterói, quando aqui morou e também Vinicius de Moraes fez várias canções na sua passagem pela cidade as presenças marcantes do casal de pintores Hilda e Quirino Campofiorito.
A lista de talentos nascidos na cidade é grande, entre outros que
são exemplos da rica memória desta cidade; o músico Sergio
Mendes, a atriz Nicette Bruno, o ator Paulo Gustavo, o pintor Antonio Parreiras, o jornalista Irineu Marinho, o escritor Antonio
Callado, a atriz Leila Diniz, os cantores Cauby Peixoto e Ronnie Von, a atriz
Lilli Leitão, o ator Leopoldo Fróes, as bailarinas Juliana Yanakieva e Marcia
Hayddée, o cineasta Nelson Pereira dos Santos, o ator Murilo Benicio e a
cantora Baby do Brasil.
Poucos sabem que é de Niterói, nascido em Jurujuba, o compositor Ismael
Silva, que criou a primeira escola de samba do País, “ A Deixa Falar”.
No entanto, Niterói parece não conhecer ou esquecer sua história, o valor de sua memória, que começou com os povos originários indígenas, sendo a única capital do País fundada por um índio, o Araribóia. Sem dúvida, está faltando na cidade um Centro de Memória.
Em recente encontro com o candidato a prefeito Rodrigo Neves (antes do falecimento de Silvio Santos), ele fez uma retrospectiva dos ciclos de desenvolvimento da cidade e falou das propostas para seu futuro governo, caso seja eleito. Rodrigo foi enfático: Vou criar o Centro de Memória de Niterói.
Niterói merece !
Mário Sousa é jornalista e Analista Político