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Luiz Antonio Mello
Aniversário do golpe militar de 1964 não pode passar em branco. As grandes tragédias não podem ser esquecidas para que não voltem a acontecer.
Nesta quinta-feira, 31 de março de 2022, o golpe de 64 faz 58 anos e um livro fundamental conta a história de um jornal que lutou contra a ditadura do primeiro o último dia.
Rato de Redação - Sig e a História do Pasquim, do produtor cultural, editor literário e jornalista, Marcio Pinheiro mostra para quem quiser saber um pouco mais da história do Brasil, por que aquele tabloide semanal, que chegou a tirar 200 mil exemplares, incomodava tanto os gorilas aquartelados em todo o país.
A aparente democracia voltou em 1985
Sobre o golpe, nesta quarta-feira (30), em seu Painel aqui em A TRIBUNA, o sempre inquieto, combativo e corajoso Jourdan Amora, jornalista perseguido pela ditadura, escreveu:
- As amargas, não, - recomendava Álvaro Moreira. O general João Batista Figueiredo, ao sair do governo pediu: Esqueçam de mim. Quem viveu o entardecer e o anoitecer de 31 de março, estava estarrecido com as ordens dos dedos-duros, agentes do DOPS e militares nas ruas. O inicial toque de recolher foi identificado como a vitória da revolução. Os períodos seguintes selaram para a história que aquele escurecer, vivido pelo povo, era para se esquecer dela, a nefasta revolução.
Começava-se a caçada às bruxas, com prisões de lideranças sindicais e estudantis e de personalidades com identidade patriótica (nacionalistas), trabalhista ou reivindicatória.
Única casa para ceias noturnas, ponto de encontro de estudantes e de todas as pessoas que trabalhavam à noite (inclusive magistrados e médicos, a Leiteria Brasil estava entupida de dedos duros, policiais, agentes secretos e líderes anticomunistas, como célebre Joaquim Metralha, aliado do almirante Pena Botto. (...)
Ditadura em Niterói
Paulo Torres escolheu para assumir a Prefeitura de Niterói o velho amigo da família, Emilio Abunahman. Para isto, era necessário cassar o popular médico dos pobres, Sylvio de Lemos Picanço, do PSP, e irmão do ex-deputado udenista, o jurista Macário Picanço.
Foi uma das mais injustas cassações e, pior, o seu sucessor permaneceu sete anos no comando da Prefeitura, até se instalar o governo do ex-integralista (PRP) e udenista Raymundo Padilha.
A aparente Democracia voltou em 1985.
O livro
Foi nesse asqueroso contexto de covardia, violência trairagens, que nascei o jornal O PASQUIM, que acaba de ganhar (enfim!) a sua biografia.
Rato de Redação - Sig e a História do Pasquim, do produtor cultural, editor literário e jornalista, Marcio Pinheiro. Com narrativa fluída e repleta de detalhes, a obra percorre o caminho de 22 anos de atividade do periódico. Tudo isso acompanhado do simpático Sig, o rato símbolo do jornal, desenhado pelo cartunista Jaguar. Sig é um deboche a Sigmund Freud, pai da psicanálise.
Desde a primeira capa, Sig teve destaque garantido no Pasquim. Ele interferia com seus comentários sarcásticos em quase todas as matérias, artigos, entrevistas e até anúncios. É a presença mais constante durante as mais de duas décadas de existência do jornal, conta Marcio Pinheiro. O personagem, aliado ao teor humorístico e a linguagem coloquial do semanário, agradou o grande público e, já em 1969, a publicação chegou à tiragem de duzentos mil exemplares.
Rato de Redação reconta desde a escolha do nome do jornal - que na definição do dicionário tem um significado quase pejorativo passando pela prisão de boa parte da equipe do veículo, em 1970. A queda do regime militar, a retomada da abertura política, a redemocratização, as crises financeiras e as divergências internas que aconteceram até seu fechamento em 1991 também são retratadas neste lançamento indicado para os apaixonados pela história do Brasil.
Invasões policiais
Trabalhei no Pasquim de 1975 até 1981. A redação funcionava na rua Saint Roman, um casarão no alto do morro do Pavãozinho, em Copacabana, que nos anos 1970 começou a ser ocupado pelo narcotráfico.
Pelo menos duas vezes embiquei na subida e os moradores avisaram os homens invadiram o jornal. Ou seja, a edição que tinha acabado de sair tinha sido empastelada, destruída na gráfica por agentes do D.O.P.S., Departamento de Ordem Política e Social, que faziam o que chamavam de varredura no casarão em busca de publicações comunistas.
Naqueles tempos ser acusado de comunista significava cadeia, tortura e, em muitos casos, morte. O Pasquim era infestado de intelectuais como Paulo Francis, Jaguar, Ziraldo e outros, mas estava longe, a milhares e quilômetros de distância do que se convencionou chamar de célula comunista.
As armas do jornal contra a ditadura era o deboche, a irreverência, o desprezo. E, dizem, muito pior do que um tiro de bazuca (Luiz Antonio Mello).